O Dhamapada budista

Por Max Muller em L.Yutang Sabedoria de Índia e China (1957) Pongetti: Rio de Janeiro


1o Capítulo: Versos Gêmeos

Tudo o que somos é o resultado daquilo que pensamos: funda-se em nossos pensamentos, é feito de nossos pensamentos. Se um homem fala ou age com um mau pensamento, o sofrimento o segue, assim como a roda segue o d boi que puxa o carro.
Tudo o que somos é o resultado daquilo que pensamos: funda-se em nossos pensamentos, é feito de nossos pensamentos. Se um homem fala ou age com um pensamento puro, a felicidade o segue tal como a sombra que jamais o abandona.
- Ele me insultou, ele me bateu, ele me abandonou, ele me roubou - os que não agasalharem tais pensamentos, deixarão de odiar.
Porque o ódio não cessa pelo ódio em nenhum tempo: o ódio cessa pelo amor - é uma lei antiga.
O mundo não sabe que nós todos devemos ter um fim aqui mesmo; mas os homens que o sabem cessam as disputas de uma vez.
Aquele que vive à procura de prazeres apenas, os sentidos sem contrôle, alimentando-se imoderadamente, preguiçoso e fraco, Mara (o tentador) certamente o vencerá tal como o vento derruba uma árvore fraca.
Aquele que vive sem procurar prazeres, os sentidos bem controlados, alimentando-se moderadamente, fiel e forte, a este Mara certamente não vencerá do mesmo modo que o vento não consegue derrubar uma montanha rochosa.
Aquele que deseja usar as roupagens amarelas sem se ter purificado dos pecados, que despreza tanto a temperança como a verdade. é indigno das vestes amarelas.
Mas aquele que se purificou de todo pecado, que é virtuoso e também dotado de temperança e sinceridade: este é, na verdade, digno das vestes amarelas.
Os que imaginam a verdade onde não existe, e vêem falsidade na verdade, jamais chegam à verdade e sim perseguem desejos vãos.
Os que percebem a verdade onde ela existe, a falsidade na falsidade, chegam à verdade e perseguem desejos verdadeiros.
Assim como a chuva penetra nas casas mal cobertas de olmo, assim a paixão penetra num espírito que não reflete.
Assim como a chuva não penetra numa casa bem coberta de olmo, a paixão não penetrará num espírito cheio de reflexão.
O que faz ó mal se lamenta neste mundo e lamentar-se-á no outro; padece em ambos. Ele se lamenta e sofre quando vê o mau resultado de sua própria obra.
O homem virtuoso acha prazer neste mundo e achará prazer no outro; acha ambos deleitáveis. Ele acha prazer e se alegra quando vê a pureza de sua própria obra.
O que faz o mal sofre neste mundo e sofrera no outro; padece em ambos. Ele sofre quando pensa no mal que fêz; sofre ainda mais, quando se vê prêso ao caminho do mal.
O homem virtuoso é feliz neste mundo e é feliz no outro; é feliz em ambos. É feliz quando pensa no bem que fêz; sente-se ainda mais feliz quando palmilha o caminho do bem.
O insensato, mesmo que possa recitar enorme trecho da lei, mas que não a cumpre, não tem direito ao sacerdócio e é como um pastor que conta as vacas dos outros.
O que segue à lei, mesmo que só possa recitar uma pequena parte. mas, tendo abandonado a paixão, o ódio e a estupidez, possui verdadeiro saber e serenidade de espírito, este, não se importando com coisa nenhuma deste mundo ou do que está para vir, tem, na verdade, direito ao sacerdócio.

2o Capítulo: Sobre o Zelo

O Zelo é a estrada da imortalidade (Nirvana), e o é descuido a estrada da morte. Os que são zelosos não morrem, os que são descuidados são como se já estivessem mortos.
Tendo compreendido isto claramente, os que progridem no zêlo nele se deleitam e alegram-se no conhecimento do eleito.
Essas pessoas prudentes, meditativas, constantes, sempre possuindo poderes fortes, atingem o Nirvana, a mais alta das felicidades.
Se Uma pessoa zelosa se eleva, se ela não fôr esquecida, se suas ações forem puras, se ela agir consideradamente, se ela moderar-se a si mesma e viver segundo a lei - então sua glória aumentará.
Elevando-se, por meio de seu zêlo, pela moderação e controle, homem prudente pode fazer de si mesmo uma ilha que nenhuma Inundação consegue cobrir.
Os néscios vão atrás da vaidade. O prudente guarda o zêlo como sua mais preciosa jóia.
Não sigas atrás da vaidade, nem em busca de prazeres de amor -e de luxúria! Aquele que é cuidadoso e meditativo obtém enorme alegria.
Quando o homem erudito expulsa a vaidade por meio do zêlo, este, o sábio, subindo às alturas estáveis da sabedoria olha para baixo para os loucos; livre de pesares olha para a multidão triste como se estivesse sôbre uma montanha olhando para baixo para os que ficam na planície.
Ativo no meio dos indolentes, desperto no meio dos que dormem, o homem prudente avança como um cavalo corredor deixando atrás o de aluguel.
Por meio do zêlo Maghavan (Indra) chegou ao império dos deuses. Louva-se a atividade; a indolência é sempre censurada.
Um Bhikshu (monge mendicante) que se deleita na atividade, que vê com medo a indolência, move-se de um lado para outro como o fogo, queimando todos os seus grilhões, pequenos ou grandes.
Um Bhikshu (monge mendicante) que acha prazer na reflexão, que olha receoso para a indolência, não pode desviar-se de seu estado perfeito - ele está perto do Nirvana.

3o Capítulo: Pensamento

Assim como o que faz flechas e arcos cuida que a flecha saía direita, um homem prudente corrige o pensamento instável e trêmulo, que é difícil de conservar, difícil de reter.
Como um peixe tirado de seu "habitat" aquoso e lançado sôbre o solo sêco, nossos pensamentos tremem todos a fim de escapar ao domínio de Mara, o tentador.
É bom domar o espírito, que é difícil de manter em sujeição e inconstante, vagando por onde bem entende; um espírito domado traz felicidade.
Deixe o homem prudente manter guarda a seus pensamentos, pois eles são difíceis de perceber, muito astuciosos e se vão para onde querem: o pensamento bem guardado traz felicidade.
Os que refreiam seus pensamentos que divagam longe, andam por toda parte só, não têm corpo e se escondem no fundo do coração, estarão livres da escravidão de Mara, o tentador.
Se a fé de um homem é instável, se ele não conhece a verdadeira lei, se a paz de seu espírito se turva, seu saber jamais será perfeito.
Se os pensamentos de um homem não se dissipam, se seu espírito não está perplexo, se ele deixou de pensar no bem ou no mal, então, não há receio para ele enquanto está atento.
Sabendo que este corpo é frágil como um vaso, e fazendo o pensamento ser forte como uma fortaleza, pode-se atacar Mara, o tentador, com a arma do saber, pode-se vê-lo quando vencido e sem descansar jamais.
Muito em breve, ai de mim! este corpo jazerá sobre a terra, desprezado, sem compreensão, tal como um lenho inútil.
O que quer que seja que um homem possa fazer a um seu desafeto, ou um inimigo a um inimigo, um espírito erradamente dirigido far-lhe-á maior mal ainda.
Nem uma mãe, nem um pai, farão tanto, nem qualquer outro parente: um espírito bem dirigido far-nos-á o maior bem.

4o Capítulo: Flores

Quem superará esta terra e o mundo de Yama, o senhor dos que partem e o mundo dos deuses? Quem descobrirá o caminho da virtude, que está claramente à vista, como um homem inteligente encontra a verdadeira flor?
O discípulo superará a terra e o mundo de Yama e o mundo dos deuses. O discípulo descobrirá o caminho da virtude, que está claramente à vista, como o homem inteligente encontra a verdadeira flor.
Aquele que sabe que este corpo é como escuma e que aprendeu que ele é tão sem substância como uma miragem, quebrará a flor de Mara e jamais verá o rei da morte.
A morte arrasta um homem que está colhendo flores e cujo espírito está distraído, como a inundação arrasta uma aldeia adormecida.
A morte subjuga um homem que está colhendo flores e cujo espírito está distraído antes que ele se tenha saciado em seus prazeres.
Assim como a abelha colhe o néctar e parte sem magoar a flor, ou tirar-lhe a cor ou perfume, assim deixe um sábio morar em sua aldeia.
Um sábio não repara nem nas perversidades dos outros, nem em seus pecados cometidos ou descuidos e sim em suas próprias más ações e descuidos.
Tal como uma linda flor, bem viva de cor mas sem perfume, são as palavras delicadas, mas inúteis, daquele que não age de acordo com o que diz.
Mas, tal como uma linda flor, cheia de cor e cheia de perfume, são as palavras delicadas e úteis daquele que age segundo o que prega.
Como muitas espécies de grinaldas podem ser feitas com um punhado de flores, assim muitas coisas boas podem ser alcançadas por um mortal desde que ele nasce.
O perfume das flores não anda contra o vento, nem tampouco o do sândalo, ou o das flores Tagara e Mallika; mas o cheiro dos bons se sente mesmo contra o vento; um homem bom entra em todo lugar.
Sândalo oo Tagara, flor de lótus, ou uma Vassiki, entre essas espécies de perfumes, o perfume da virtude é inexcedível.
Medíocre é o perfume que vem de Tagara e do sândalo; o perfume daqueles que possuem virtude sobe até os deuses como os mais puros.
Entre as pessoas que possuem essas virtudes, que vivem sem indolência e que estão emancipadas por meio do verdadeiro saber, Mara ,o tentador, jamais se insinuará.
Assim como sôbre um monte de lixo lançado na estrada, o lírio crescerá cheio de perfume e beleza, assim, entre os que são meros cascalhos, o discípulo do verdadeiro Buda iluminado brilhará por seu saber acima do humano deslumbrado.

5o Capítulo: O Néscio

Longa é a noite para aquele que está acordado; longa é a distância para aquele que está cansado; longa é a vida para o néscio que não conhece a verdadeira lei.
Se um viajante não se encontra com alguém que lhe seja superior, ou igual, deixá-lo continuar firmemente sua viagem solitária; não há companhia na de um néscio.
"Esses filhos me pertencem, e esses bens também me pertencem" - com tais idéias um néscio se atormenta. Ele mesmo não se pertence a si mesmo; como lhe pertencerão os filhos e a riqueza?
O tolo que percebe sua futilidade, é um tanto sábio. Mas um tolo que se julga sábio, este deve ser chamado de verdadeiramente tolo.
Se um tolo associar-se a um sábio mesmo que seja durante a vida inteira, ele perceberá tão pouco a verdade como a colher sente o gosto da sopa.
Se um homem inteligente associar-se, por um minuto que seja, com um sábio, ele depressa perceberá a verdade, assim como a língua sente logo o gosto da sopa.
Os tolos de compreensão pobre têm-se a si mesmos como os seus maiores inimigos, pois eles cometem más ações que dão frutos mais amargos ainda.
Não é uma boa ação aquela da qual um homem pode arrepender-se, e cuja recompensa ele recebe chorando e com expressão pesarosa.
Não, a boa ação é aquela da qual o homem não se arrepende e cuja recompensa ele recebe alegre e satisfeito.
Enquanto a má ação não produz frutos, o tolo pensa que ela
é como mel; mas quando amadurece, então, o tolo sofre aflições. Mesmo que um tolo, mês após mês, coma sua comida (como um asceta) com a extremidade do talo cortante da erva Kusa, ainda assim ele não vale a décima - sexta parte daquele que ponderou bem a lei.
A má ação, como o leite recém - ordenhado, não se transforma subitamente; abafada, como fogo coberto pelas cinzas, ela segue o tolo.
E quando a má ação, após ter se tornado conhecida, se transforma em tristeza para o tolo, então ela destrói sua brilhante sorte, mais ainda, racha-lhe a cabeça. Deixe o tolo desejar uma reputação falsa, a precedência entre os Bhikshus, o domínio nos conventos, a veneração entre outras pessoas!
- "Que o leigo e aquele que abandonou o mundo possam pensar que isto foi feito por mim; possam eles sujeitar-se a mim em tudo o que deve ser feito ou não deve ser feito", - tal é o espírito do tolo e o seu desejo e orgulho crescem.
- "Uma é a estrada que leva à riqueza, outra é a estrada que leva ao Nirvana" - se o Bhikshu, o discípulo de Buda, aprendeu isto, ele não ansiará por honras, ele se esforçará mesmo após sua separação do mundo.

6o Capítulo: O Homem Prudente

Se você vir um homem que lhe mostra o que deve ser evitado, que administra repreensões e é inteligente, siga êsse homem sábio como seguiria aquele que lhe falasse de tesouros escondidos; será melhor, não pior, para aquele que o segue.
Deixá-lo admoestar, deixá-lo ensinar, deixá-lo proibir o que é impróprio! - ele será amado pelos bons e será odiado pelos maus.
Não tenha por amigos os que praticam ações más, não faça amigos entre as pessoas de sentimentos baixos: faça amigos entre os virtuosos, tenha amigos entre os melhores homens.
Aquele que vai à fonte da lei vive feliz com o espírito tranqüilo: o sábio alegra-se sempre na lei, tal como foi pregada pelo eleito.
Os que distribuem água levam a água para onde quer que queiram; os que fazem arcos e flechas curvam o arco a seu gosto; os carpinteiros trabalham num tronco de lenha;. os sábios moldam-se a si mesmos.
Assim como uma rocha sólida não é sacudida pelo vento, as pessoas sábias não vacilam entre a censura e a lisonja.
Os sábios, após terem ouvido as leis, tornam-se serenos, tais como um lago profundo, parado e calmo.
OS homens bons, na verdade, agem prudentemente sob tôdas as circunstâncias; os bons não exprimem um desejo de recompensa sensual; sejam tocados pela felicidade ou pelos pesares, os prudentes jamais parecem ensoberbecidos nem deprimidos.
Se, seja por amor a si mesmo, ou por amor aos outros, um homem não deseja nem um filho, nem riqueza, nem poderes, e se ele não deseja seu próprio sucesso por meios injustos, então ele é bom, prudente e vIrtuoso.
São poucos entre os homens os que chegam à outra margem (tornam-se Arhats); os demais correm praia abaixo, praia acima.
Mas aqueles que, quando a lei lhes foi bem pregada, a seguem, passarão por cima dos poderes da morte, embora difíceis de atravessar.
Um sábio deixaria o estado de ignorância da vida ordinária e seguiria o estado brilhante do Bhikshu. Após ir de sua casa para a condição de um sem lar, ele, em seu isolamento, encontraria diversão onde ela parecesse difícil. Deixando paro trás todos os prazeres e nada tendo para chamar de seu, o sábio se purificará de tôdas as preocupações espirituais.
Aqueles cujo espírito está firmemente baseado nos sete elementos do saber, que sem apegar-se a coisa alguma, alegram-se na falta de afeições, cujos apetites foram dominados, e que estão cheios de luz, esses são livres até neste mundo.

7o Capítulo: O Venerável

Não há sofrimento para aquele que terminou a viagem, e abandonou o pesar, que se libertou de todos os lados e lançou fora todo os grilhões.
Eles se apuram com os pensamentos bem coligidos, eles não permanecem em sua morada; tal como cisnes que abandonam o lago em que nasceram, eles deixam sua casa e seu lar.
Os homens que não têm riquezas, que perceberam o vácuo e a liberdade sem condições (Nirvana), seu caminho é de difícil compreensão, tal como o dos pássaros no ar.
Aquele cujos apetites estão entorpecidos, que não se absorve em diversões, que percebeu o vácuo e a liberdade incondicional (Nirvana), seu caminho é de compreensão difícil, tal como o dos pássaros no ar.
Até os deuses invejam aquele cujos sentidos, como os cavalos bem dominados pelo cavaleiro, foram subjugados, que vive livre de orgulho e livre de desejos; um tal homem, que cumpre seu dever, é tolerante como a terra, ou como uma soleira de porta; ele é como um lago sem lama, não nascerá outra vez.
Seu pensamento é calmo, calmas são suas palavras e ações, quando obteve a liberdade por meio do verdadeiro conhecimento.
O homem que está livre da credulidade, mas que conhece o que- não foi criado, que cortou todos os laços, removeu todas as tentações, renunciou a todos os desejos, ele é o maior dos homens.
Numa aldeia ou numa floresta, no mar ou em terra firme, em qualquer lugar em que vivam as pessoas veneráveis (Arahanta), este lugar é delicioso.
As florestas são encantadoras; onde o mundo não encontra prazer, ali os indiferentes encontrarão prazeres, pois eles não andam atrás de gozos.

8o Capítulo: As Mil

Mesmo que um discurso contenha mil (palavras), mas feito de palavras sem sentido, é melhor uma só palavra de senso, pois se um homem a ouvir acalmar-se-á.
Mesmo que um Gatha (poema) tenha mil (palavras), mas que sejam palavras sem sentido, uma só palavra de um Gatha será melhor, pois se um homem a ouvir, acalmar-se-á.
Embora um homem recite cem Gathas feitos com palavras sem sentido, uma só palavra da lei será melhor, pois se um homem a ouvir acalmar-se-á.
Se um homem vencer numa batalha mil vêzes mil homens, e se- um outro vencer-se a si mesmo, este será o maior dos vencedores.
A conquista do próprio eu é bem melhor do que a de qualquer outro ser; nem mesmo um deus, um Gandharva, nem Mara (com Brahman), podem transformar em derrota a vitória de um homem que venceu a si mesmo, e sempre vive sob sujeição.
Se um homem durante centenas de anos faz sacrifícios todos os meses junto com mil outros, e se ele, apenas por um minuto, presta: homenagem a um homem cuja alma baseia-se no verdadeiro saber, é melhor essa homenagem do que os sacrifícios prestados durante centenas de anos.
Mas aquele que vive centenas de anos, vicioso e sem freios, a vida de um só dia é melhor caso seja virtuoso e refletido.
E aquele que vive uma centena de anos, ignorante e sem freio, a vida de um só dia será melhor se for um homem prudente e refletido.
E aquele que vive centenas de anos, preguiçoso e fraco, a vida de um só dia é a melhor se o homem alcançou força verdadeira.
E aquele que vive centenas de anos, sem ver o princípio e o fim, a vida de um só dia é a melhor caso o homem veja o princípio e o fim
E aquele que vive cem anos, sem ver o lugar imortal, a vida de um só dia é melhor quando um homem vê o lugar imortal.
E aquele que vive Uma centena de anos sem ver a mais alta das leis, a vida de um só dia é melhor quando o homem vê a mais alm das leis.

9o Capítulo: O Mal

Um homem deve apressar-se em direção ao bem e deve guardar o pensamento longe do mal; se um homem faz o que é bom indolentemente. seu espírito se compraz do mal.
Se um homem comete um pecado, não o deixe cometê-lo outra vez; não o deixe deleitar-se no pecado: o acúmulo de mal é doloroso.
Se um homem faz o que é bom, deixe-o fazê-lo novamente; deixe-o deleitar-se com o bem: o acúmulo de boas obras é delicioso.
Até um homem que pratica o mal vê a felicidade enquanto os frutos de sua má ação não amadurecem; mas quando eles ficam maduros, então o que pratica o mal vê o mal.
Até o homem bom vê dias maus enquanto suas boas ações não amadurecem; mas quando os frutos dessas boas ações amadurecem, então ele, o homem bom, vê as coisas boas.
Que nenhum homem pense levianamente sobre o mal dizendo no fundo do coração - "Ele não penetrará em mim." Assim como a água caindo em gotas enche um pote, assim o tolo se enche de mal embora ele o vá recolhendo pouco a pouco.
Que nenhum homem pense levianamente sôbre o bem dizendo no fundo do coração - "Ele não penetrará em mim." Até o pote se enche com a água que cai gota a gota; o homem sábio acaba se enchendo de bem mesmO que o colha pouco a pouco.
Que um homem evite as más ações, assim como o mercador, que tem poucos companheiros e leva consigo muita riqueza, evita a estrada perigosa; pois o homem que ama a vida evita o veneno.
Aquele que não tem ferimento na mão pode tocar o veneno: o veneno não afeta aquele que não tem ferimento; tampouco há mal para aquele que não o comete.
Se um homem durante centenas de anos adora Agni (fogo)- na floresta, e se ele apenas por um momento presta homenagem a um homem cuja alma baseia-se no verdadeiro saber, é melhor esta homenagem do que o sacrifício de centenas de anos.
Tudo o que um homem sacrificar neste mundo como uma oferenda ou uma oblação durante um ano inteiro a fim de obter mérito, tudo o que fizer não valerá um quarto de vintém; a reverência demonstrada para o justo é a melhor.
Aquele que sempre saúda e constantemente respeita os idosos, quatro coisas sempre lhe prosperarão: a vida, a beleza, a felicidade.- e o poder.
Se um homem ofender uma pessoa inofensiva, pura e inocente, o mal cairá de volta sobre aquele néscio, tal como a poeira leve é lança da para trás pelo vento.
Alguns homens nascem outra vez; os que praticam o mal vão para o inferno; os virtuosos vão para os céus; aqueles que estão livres de tôdas as ambições deste mundo atingem o Nirvana.
Nem no céu, nem no meio das ondas do oceano, nem se entrarmos nas fendas das montanhas, não há nenhum lugar conhecido no mundo inteiro onde um homem possa livrar-se de uma má ação cometida.
Nem no céu, nem no meio das ondas do oceano, nem se entrarmos nas fendas das montanhas, não há lugar conhecido em todo o mundo onde a morte não vá em busca do mortal.

10o Capítulo: Castigo

Todos os homens tremem ante o castigo, todos os homens receiam a morte; lembre-se de que você é como eles, e não mate, nem cause carnificina.
Todos os homens tremem ante o castigo, todos os homens amam a vida; lembre-se de que é feito como eles e não mate nem cause matanças.
Aquele que, procurando a própria felicidade, pune ou mata seres que também anseiam pela felicidade, não encontrarão felicidade após a morte.
Aquele que, procurando sua própria felicidade, não pune ou mata seres que também anseiam pela felicidade, encontrarão a felicidade após a morte.
Não fale asperamente com ninguém: aqueles com quem você fala lhe responderão do mesmo modo. Um modo de falar áspero é aflitivo: golpe por golpe e sentir-se-á tocado.
Se, tal como um prato de metal partido (gongo), não profere uma palavra, então você chegou ao Nirvana; você desconhece a cólera.
Assim como o pastor, que com o seu cajado, guia as vacas para o estábulo, assim a Idade e a Morte guiam a vida dos homens.
Um tolo não sabe quando comete suas más ações: mas o perverso se queIma com suas próprias ações, como se se queimasse no fogo.
Aquele que inflige sofrimento a pessoas inocentes e inofensivas, em breve terá chegado a um desses dez estados:
Terá sofrimentos cruéis, perda, injúria física, pesadas aflições ou perda de memória.
Uma infelicidade proveniente do rei, ou uma terrível acusação, ou perda de relações, ou destruição de tesouros.
O raio destruirá sua casa; e quando o corpo estiver destruído também, o tolo irá para o inferno.
Nem a nudez, nem o cabelo entrançado, nem o sujo, nem o jejum, ou o deitar sobre a terra, nem se esfregar no Pó, nem o sentar-se sem fazer movimento, podem purificar um mortal que não dominou as ambições.
Aquele que, embora vestido com apuro, vive tranqüilamente, é calmo, submetido, refreado, casto e deixou de achar defeito em todos os outros seres, ele é na verdade um brâmane, um asceta (sramana) , um frade (bhikshu).
Haverá neste mundo algum homem tão moderado pela vergonha que não provoque censura, assim como o cavalo nobre com o chicote?
Tal como um cavalo de sangue quando tocado pelo chicote, seja tenaz e ardente, e pela fé, pela virtude, pela energia, pela meditação, pelo discernimento da lei, superará este grande sofrimento, perfeito no saber e no comportamento, e jamais esquecido.
Os que distribuem a água levam-na para onde querem; os que fazem arcos e flechas dão forma às setas; os carpinteiros dão forma aos lenhos; os bons moldam-se segundo eles mesmos.

11o Capítulo: Velhice

Como há risos, como há alegria, e este mundo está sempre em fogo? Não procurais a luz, vós que estais cercados pelas trevas?
Olhai para esse estúpido bem vestido, coberto de feridas, doentio, cheio de muitos planos, mas que não tem nem fôrça nem influência.
Este corpo está gasto, cheio de doenças e frágil; esse monte de corrupção quebra-se em pedaços, a vida na verdade termina com a morte.
Depois que se olhou para aqueles ossos acinzentados, postos fora como abóboras no outono, qual o prazer que têm na vida!
Depois que foi feita com os ossos uma fortaleza, foi coberta com carpe e sangue e nela ficaram vivendo até a velhice e a morte, o orgulho e a impostura.
As brilhantes carruagens dos reis são destruídas, o corpo também chega à destruição, mas a virtude dos bons jamais é destruída - assim dizem os bons aos bons.
Um homem que pouco aprendeu, cresce como um boi; sua carne cresce, mas seu saber não aumenta.
Em procura do construtor deste tabernáculo, percorri várias famílias, sem encontrá-lo; e dolorosamente a descendência uma e duas vêzes. Mas agora, construtor de tabernáculo, foste visto; não terminarás este tabernáculo outra vez. Todas as tuas vigas estão quebradas, a tua serra está partida; o espírito, aproximando-se do Eterno (visankhara, nirvana) alcançou a extinção de todos os desejos.
Os homens que não observaram uma disciplina determinada e que não 9btiveram fortuna durante a mocidade, morrem como velhas garças num lago sem peixes.
Os homens que não observaram disciplina determinada e que não obtiveram fortuna na mocidade, jazem, como arcos partidos, suspirando pelo passado.

12o Capítulo: O Eu

Se um homem se tem em alta conta, deixá-lo observar-se cuidadosamente; ao menos numa de três auto-observações um homem prudente se sentirá atento.
Que cada homem se dirija primeiro para o que é indicado, depois que ele ensine aos outros, assim um homem prudente não sofrerá.
Se um homem age como ele ensina os outros a agirem, então, sendo ele mesmo bem moderado, pode moderar os outros; porque o próprio eu é difícil de sujeição.
O eu é o senhor do eu, quem mais podia ser o senhor? Com o próprio eu bem dominado, um homem encontra um senhor como bem poucos podem achar.
Aquele cuja perversidade é muita põe-se naquele estado em que os inimigos desejam vê-lo, como um réptil faz com a árvore ao pé da qual se acha.
Más ações e atos que depois nos ferem são fáceis de fazer: o que é benéfico e bom, eis o que é difícil de levar a cabo.
O néscio que despreza a lei do venerável (Arhat) , do eleito (Ariya) , do virtuoso, e segue uma doutrina falsa, alimenta motivos para sua própria destruição, tal como os frutos do caniço Katthaka.
Por meio do próprio eu se faz o mal, por causa do próprio eu se sofre; por causa do próprio eu o mal é obstado, por causa do próprio eu chega-se à purificação. O puro e o impuro erguem-se e caem por si mesmos, ninguém pode purificar outrem.
O néscio que despreza a lei do venerável (Arhat) , do eleito Outros, embora importantes; que um homem, após discernir seu próprio dever, se mostre sempre atento a seu cumprimento.

13o Capítulo: O Mundo

Não sigais a lei do mal! Não vivas na ociosidade! Não sigas a falsa doutrina! Não sejas amigo do mundo.
Ergue-te! não sejas preguiçoso! Segue a lei da virtude! Os virtuosos descansam na bem-aventurança neste mundo e no outro.
Segue a lei da virtude; não sigas a do pecado. Os virtuosos descansam abençoados neste mundo e no outro.
Olha e considera o mundo como farias com a água borbulhando olha e considera-o como farias com uma miragem: o rei da morte não vê aquele que assim olha e considera o mundo.
Vem, olha para este mundo, brilhando como uma carruagem real, os tolos nele imergem, mas os sábios nem a tocam.
Aquele que antes era sem cuidados e que depois fica grave, IlumIna este mundo tal como a luz quando livre de nuvens.
Aquele cujos maus atos são cobertos com boas ações, ilumina este mundo tal como a luz quando livre de nuvens.
Este mundo é escuro, poucos apenas conseguem ver nele; são poucos os que vão para o céu tais como pássaros que figuram da armadilha.
Os cisnes prosseguem no caminho do sol, milagrosamente atravessam o éter: os sábios são levados para fora deste mundo quando venceram Mara e seu séquito.
Se um homem transgrediu a única lei e fala mentiras e zomba do outro mundo, não há mal que não seja capaz de fazer.
Os que não são caridosos não vão ao mundo dos deuses; apenas os tolos não elogiam a liberalidade; um sábio se rejubila com liberalidade e por meio dela se torna um dos abençoados no outro mundo.
Melhor do que a sabedoria na terra, melhor do que ir para o céu, melhor do que o poderio sôbre todos os mundos, é a recompensa do Sotapatti, o primeiro passo na santidade.

14o Capítulo: Buda – O Desperto

Aquele que faz conquistas que não podem ser feitas outra vez e as quais ninguém deste mundo empreende, por que caminho você pode guiá-lo, o Desperto, o Onisciente, ou o não percorrido?
Aquele a quem nenhum desejo com suas armadilhas e venenos consegue desviar, por que trilha você pode guiá-lo, o Desperto, o Onisciente, ou o não percorrido?
Até os deuses invejam os que estão despertos e não são esquecidos, que são dados à meditação, que são prudentes e que acham prazer no repouso do isolamento do mundo.
Difícil de obter é a concepção dos homens, difícil é a vida dos mortais, difícil é ouvir a Verdadeira Lei, difícil é a origem do Desperto (aproximação de Buda).
Não cometer nenhum pecado, fazer o bem e purIfIcar o próprio espírito, eis o ensinamento de todos os Despertos.
O Desperto sofre pacientemente o mais severo castIgo, suportando muito tempo o mais alto Nirvana; porque ele não é um anacoreta (pravragita) que fere os outros, ele não é como um asceta (sramana) que insulta os outros.
Não censurar, não ferir, viver moderadamente sob a lei, ser sóbrio em comer, dormir e sentar-se só e viver com os mais elevados pensamentos - eis o que ensina o Desperto.
Não há luxúria que satisfaça, mesmo para um homem que possua muitas peças de ouro; aquele que sabe que a luxúria tem gosto de pequena duração e que causa sofrimentos, este é sábio; até nos prazeres celestes ele não encontra satisfação, o discípulo que está completamente desperto acha prazer apenas na destruição de todos os desejos.
Os homens, levados pelo medo, procuram muitos refúgios, desde a montanha às florestas, dos bosques às árvores sagradas.
Mas não há um refúgio seguro, não há um refúgio melhor; um homem não se livra de todos os sofrimentos após ter procurado aquele refúgio.
Aquele que se refugia em Buda, na Lei e na Comunidade; aquele que, com compreensão nítida, vê as quatro verdades sagradas: sofrimento, a origem do sofrimento, a destruição do sofrimento e o oito vêzes santo caminho que leva ao apaziguamento da dor - eis o , refúgio seguro, eis o melhor refúgio; tendo ido para êsse refúgio, um homem se livra de todo o sofrimento.
Um ser sobrenatural (um Buda) não é facilmente encontrado; ele não nasce em qualquer parte. Onde quer que um tal sábio nasça, tal raça prospera.
Feliz é o levantar do Desperto, feliz é o ensino da Verdadeira Lei, feliz é a paz na Comunidade, feliz é a devoção dos que estão em paz.
Aquele que presta homenagem àqueles que a merecem, seja o desperto (Buda) ou seus discípulos, os que superaram a hoste de males e atravessaram a inundação de pesares, aquele que presta homenagem a tais coisas como se tivesse encontrado a libertação e não conhecesse o medo, seu mérito jamais pode ser medido por ninguém.

15o Capítulo: A Felicidade

Vivemos muito felizes na verdade, sem odiar aqueles que nos odeiam entre os homens que nos odeiam vivemos livres de ódios! Vivemos felizes na verdade, livres de sofrimentos entre os que sofrem! entre homens que sofrem deixe-nos viver livres de sofrimentos!
Vivemos felizes na verdade, livres de ambição entre os ambiciosos! entre os homens ambiciosos deixe-nos viver livres de ambições!
Vivemos felizes na verdade, embora nada tenhamos que possa- mos chamar nosso! Seremos como os deuses radiosos, alimentando-se de felicidade!
A vitória alimenta o ódio, porque os vencidos são infelizes. Aquele que abandona tanto a vitória como a derrota, este, o tranqüilo, é feliz.
Não há fogo igual à paixão; não há esfôrço perdido como o ódio; não há dor como a deste corpo; não há felicidade maior do que o repouso.
A fome é o pior dos males, os elementos do corpo o maior mal; se alguém souber disso verdadeiramente, eis o Nirvana, a mais elevada das felicidades.
A riqueza é o maior dos dons, a satisfação é a melhor riqueza; a confiança é o melhor dos parentescos, Nirvana, a mais alta felicidade.
Aquele que provou a doçura da solidão e da tranqüilidade, está livre do mêdo e livre do pecado, enquanto prova a doçura de beber na fonte da lei.
A vista dos eleitos (Ariya) é boa, viver com eles é sempre motivo de felicidade; se um homem não vê néscios, será verdadeiramente feliz.
Aquele que anda na companhia dos tolos padece o caminho todo; a companhia dos tolos, assim como a do inimigo, é sempre difícil de suportar; a companhia dos sábios dá prazer tal como encontrar-se com a parentela.
Por conseguinte, deve-se seguir os sábios, os inteligentes, os prudentes, O muito paciente, o cumpridor dos deveres e o eleito;
deve-se seguir um homem tão bom e sábio assim como a lua segue o caminho das estreIas.

16o Capítulo: Prazer

Aquele que se entrega à vaidade e não se dá à meditação, esquecendo-se do verdadeiro alvo da vida e apegando-se a todo prazer, no devido tempo invejará aquele que se exercitou na meditação.
Que nenhum homem jamais se apegue ao agradável, ou ao que é desagradável. Não ver o que é agradável é sofrimento, e é sofrimento ver o que é desagradável.
Portanto, que nenhum homem ame coisa alguma; a perda do que se ama é um mal. Os que nada amam e nada detestam, não têm grilhões.
Do prazer decorre o pesar, dos prazeres vem o mêdo; aquele que está livre de prazeres não conhece nem o pesar nem o mêdo.
Da afeição decorre o pesar, da afeição vem o mêdo; aquele que está livre da afeição não conhece nem o pesar nem o mêdo.
Do luxo vem o pesar, do luxo vem o mêdo; aquele que está livre do luxo não conhece nem o pesa. nem o mêdo.
Do amor decorre o pesar, do amor decorre o mêdo; aquele que está livre do amor desconhece o pesar e o mêdo.
Da ambição vem o pesar, da ambição vem o mêdo; aquele que está livre da ambição desconhece o pesar e o mêdo.
Aquele que possui virtude e inteligência, que é justo, fala a verdade e cuida do que é de sua conta, este o mundo terá em apreço.
Aquele em quem brotou um desejo por alcançar o Inefável (Nirvana), que em espírito está satisfeito, e cujos pensamentos não são transportados pelo amor, este é chamado urdhvamsrotas (levado para cima pela corrente).
Parentes, amigos e amantes saudai um homem que estêve muito tempo longe e que volta de longe são e salvo.
Do mesmo modo suas boas obras recebem aquele que as fêz e que foi deste mundo para o outro - assim como um parente recebe um amigo ao voltar.

17o Capítulo: Cólera

Que um homem ponha de lado a cólera, que ele esqueça o orgulho, que se livre de tôda a escravidão! Nenhum sofrimento cai sôbre o homem que não se apega ao nome e à forma e que a coisa nenhuma chama de sua.
Aquele que domina uma cólera nascente tal como uma carruagem desabalada, a este eu chamo d'e verdadeiro condutor; aos outros considero apenas como seguradores de rédeas.
Que um homem domine a cólera por meio do amor, que do- mine o mal com o bem; que domine a avareza com a liberalidade, a mentira com a verdade!
Fala a verdade, não cedas à cólera; dá, se te pedirem um pouco; por meio dêsses três passos chegarás perto dos deuses.
Os sábios que não injuriam ninguém e que sempre controlam seus corpos, êsses irão para o lugar que não muda nunca (Nirvana), onde, se tiverem ido, não sofrerão mais.
Aqueles que estão sempre observando, que estudam noite e dia e que se esforçam em prol de Nirvana, terão pôsto um fim a suas paixões.
Eis um velho ditado, ó Atula, não é como hoje - "Eles censuram-no porque fica calado, eles o censuram porque fala muito, também censuram o que pouco diz; não há ninguém no mundo que não seja censurado."
Nunca houve, nunca haverá, nem há agora, um homem que sempre seja censurado, ou um outro que seja sempre elogiado.
Mas aquele a quem os que sabem distinguir louvam continua- mente dia após dia como sem mácula, como prudente e rico em saber e virtude, quem ousaria censurá-lo, sendo ele semelhante a uma moeda feita de ouro tirado do rio Gambu? Até os deuses o louvam ele é louvado até pelo Brahman.
Toma cuidado com a cólera do teu corpo e controla o corpo! Deixa os pecados do corpo e pratica a virtude com o teu corpo!
Cuida da cólera da língua e controla tua língua! Deixa os pecados da língua e pratica a virtude com tua língua!
Toma cuidado com a cólera do espírito e controla teu espírito! Abandona os pecados do espírito e pratica a virtude com teu espírito!
Os sábios que controlam o corpo, que controlam a língua, os sábios que controlam o espírito são na verdade bem controlados.

18o Capítulo: Impureza

És agora como a fôlha murcha, os mensageiros da morte (Yama) chegaram-se para perto de ti; estás de pé à porta da tua partida e não tens provisões para tua jornada.
Faze de ti mesmo uma ilha, trabalha muito, sê prudente! Quando tuas impurezas forem expulsas, estarás livre de culpa, entrarás no mundo celestial dos eleitos (Ariya).
Tua vida chegou ao fim, estás perto da morte (Yama), não há lugar de repouso à tua espera na estrada, e não tens provisões para tua jornada.
Faze de ti mesmo uma ilha, trabalha muito, sê prudente! Quando tuas impurezas forem lançadas fora, estarás livre de culpa, não entrarás novamente no nascimento e no declínio.
Deixa o sábio lançar fora suas próprias impurezas, assim como o ferreiro lança fora as impurezas da prata, uma a uma, pouco a pouco, e de vez em quando.
Assim como a impureza que sai do ferro, quando dêle brota, o destrói; assim as próprias ações do transgressor o levam para o mau caminho.
A nódoa dos que rezam é a não repetição; a nódoa das casas, a falta de reparo; a nódoa da pele é negligência; a nódoa do sentinela, o descuido.
A má conduta é a nódoa da mulher, a mesquinharia a nódoa do benfeitor; os que têm nódoas são todos os que seguem os maus caminhos, tanto neste mundo como no outro.
Mas há uma nódoa pior do que tôdas as outras - a ignorância é a maior das nódoas. Ó mendigos! Lancem fora essa nódoa e tornem-se imaculados!
A vida é fácil de viver para um homem que não tem vergonha; um herói gabola, um homem que causa prejuízos, um insolente, um atrevido e um infeliz. Mas a vida é difícil de viver para um homem modesto que sempre procura o que é puro, que é desinteressado, calmo, sem máculas e inteligente.
Aquele que destrói a vida, que fala inverdades, que no mundo toma para si o que não lhe é devido, que procura a mulher de outro; e o homem que se entrega à bebida de licores entorpecentes, este, até neste mundo, desenterra suas próprias raízes.
Ó homem, sabe o seguinte, que os que não têm freios ficam em mau estado; cuida que a avareza e o vício não lhe tragam pesares para muito tempo!
O mundo dá de acôrdo com a fé ou de acôrdo com o prazer: se um homem se aborrece por causa da comida e da bebida dadas a outros, ele não encontrará repouso nem de dia nem dos noite.
Aquele em quem este sentimento está destruído e o expurga até mesmo à raiz, encontra descanso dia e noite.
Não há fogo que se compare à paixão, não há fraude como o ódio, não há armadilha como a estupidez, não há torrente como a avareza. A falta dos outros é facilmente percebida, mas a de si próprio é difícil de perceber; um homem esquadrinha as culpas do vizinho como coisa de pouco valor, mas suas próprias culpas ele esconde, como um embusteiro esconde o dado viciado do outro jogador.
Se um homem procura as faltas dos outros e está sempre disposto a ofender-se, suas próprias paixões crescerão e ele está longe da destruição de paixões.
Não há caminho através o ar, um homem não é um Samana exteriormente. O mundo se compraz na vaidade, os Tathagatas (os Budas) estão livres de vaidade.
Não há caminhos no céu, um homem não é exteriormente um Samana. Nenhum ser é eterno; mas os despertos (Buda) nunca se debilitam.

19o Capítulo: O Justo

Um homem não é justo desde que resolve um assunto pela violência; não, aquele que distingue tanto o direito como o errado, que é preparado e guia os outros, não pela violência, mas pela mesma lei, sendo um guarda da lei e inteligente, este é chamado justo.
Um homem não é sábio porque fala muito; aquele que é paciente, livre de ódios e mêdo, este é chamado sábio.
Um homem não é um sustentáculo da lei porque fala muito;. mesmo que um homem tenha aprendido pouco, mas vê a lei corporificada, ele é um sustentáculo da lei, um homem que jamais negligência a lei.
Um homem não é um ancião porque tem a cabeça grisalha; pode ter a idade madura, mas é chamado "Velho em vão".
Naquele em que há a verdade, a piedade, a moderação, o freio, aquele que está livre da impureza, este é chamado um ancião.
Um homem invejoso, mesquinho e desonesto não fica sendo respeitável por meio de muito falar somente ou pela beleza de sua pele.
Aquele em que tudo isto está destruído e extirpado até as raízes, este quando livre do ódio, é chamado respeitável.
Não é pela tonsura que um homem indisciplinado que fala falsidades se torna um Samana (1); pode ser um Samana um homem que ainda está cativo dos desejos e da avareza?
Aquele que sempre apazigua o mal, seja pequeno ou grande, é chamado um Samana (um homem calmo) porque acalmou todo o mal.
Um homem não é um mendigo (Bhikshu) simplesmente por- que pede esmolas a outros; aquele que adota tôda a lei é um Bhikshu, e não aquele que apenas suplica.
Aquele que está acima do bem e do mal, que é casto, que passa pelo mundo com cuidado, este na verdade é chamado um Bhikshu.
Um homem não é um Muni (2) porque observa silêncio caso seja tolo e ignorante; mas o sábio que, como com a balança, escolhe o bem e evita o mal, este é Muni e será um Muni por meio disso; aquele que neste mundo pesa ambos os lados é chamado um Muni.
Um homem não é um eleito (Ariya) porque injuria criaturas que vivem; portanto é um homem chamado Ariya.
Não somente com disciplina e votos não apenas pelo muito saber, não por entrar em êxtases, não por dormir só, eu obtenho a felicidade da libertação que nenhum mundano pode conhecer. O Bhikshu, aquele que obteve a extinção dos desejos, este obteve a confiança.
1 - Forma pali do sânscrito Sramana, um asceta.
2 - Um santo sábio.

20o Capítulo: O Caminho

O melhor dos caminhos é o de oito estradas (3); a melhor das verdades, as quatro palavras (4); a melhor das virtudes, a indiferença; o melhor dos homens é o que tem olhos para ver.
É este o caminho, não há outro que leve à purificação da inteligência. Vá por este caminho! Eis a confusão de Mara, o tentador.
Se você seguir este caminho, você porá fim à dor! Eis o caminho que eu aconselhei, quando compreendi a remoção dos espinhos na carne.
Você mesmo deve fazer um esfôrço. Os Tathagatas (Budas) são pregadores apenas. O meditativo que entra nesse caminho fica livre da escravidão de Mara.
- "Todas as coisas criadas perecem" - aquele que sabe e vê isso torna-se passivo no sofrimento; eis o caminho para a purificação.
- "Tôdas as coisas criadas são pesares e dores" - aquele que sabe e vê isto torna-se passivo na dor; eis o caminho que leva à purificação.
- "Tôdas as formas são irreais" - aquele que sabe e vê isto torna-se passivo na dor; eis o caminho que conduz à purificação.
Aquele que não se levanta quando é tempo de levantar-se, que, embora jovem e forte, é indolente, cuja vontade e pensamento são fracos, esse homem preguiçoso e indolente jamais encontra o caminho do saber.
Observando suas palavras, com o espírito bem domado, que um homem jamais cometa qualquer erro com o seu corpo! Que um homem apenas guarde essas três veredas de ação bem desimpedidas e alcançará o caminho que os sábios indicam.
Por meio do zêlo ganha-se o saber, por meio da falta de zêlo nós o perdemos; deixemos que um homem que conheça esse caminho duplo de ganho e perda assim se coloque a fim de que o conhecimento possa crescer.
Abate uma floresta inteira de desejos, e não apenas uma árvore! O perigo provém da floresta de desejos. Quando tiverem abatido tanto a floresta de desejos como as plantas rasteiras, então, Bhikshu, estareis livres da floresta e dos desejos!
Enquanto houver o desejo do homem pelas mulheres, mesmo que seja menor, sem ter destruído, seu espírito estará escravizado, assim como o bezerro que mama está escravizado à sua mãe.
Extirpa o amor-próprio, como um lótus outonal, com tua mão! Tem em alta conta a estrada da paz. O Nirvana foi mostrado por Sugata (Buda).
- "Aqui viverei na chuva, aqui ficarei inverno e verão" - assim medita o tolo, e não pensa na morte.
A morte vem e faz desaparecer aquele homem, respeitado pelos filhos e parentes, seu espírito se separa, assim como a inundação faz desaparecer uma aldeia adormecida.
Os filhos nada adiantam, sem um pai, nem os parentes; não há auxílio da parte dos parentes que valha para aquele de quem a morte se apossou.
Um homem sábio e de bom comportamento que compreenda o significado disto, depressa desbravará o caminho que leva ao Nirvana.
3 - Doutrina Correta, Propósito Correto, Discurso Correto, Modo de portar-se Correto, Pureza Correta, Pensamento Correto, Solidão Correta, Êxtase Correto.
4 - Ver o capítulo 14.

21o Capítulo: Miscelânea

Se, ao deixar um pequeno prazer, alguém procura um prazer maior, deixe um homem sábio abandonar o pequeno prazer e olhar para o grande.
Aquele que, causando sofrimento a outrem, deseja obter prazer para si mesmo, enredado nos liames do ódio, jamais se livrará do
ódio.
O que deve ser feito é negligenciado, o que não deve ser feito é feito; os desejos das pessoas desregradas e levianas estão sempre crescendo.
Mas aqueles cuja vigilância está sempre dirigida para seu corpo, que não seguem o que deve não ser feito e que prontamente fazem o que deve ser feito, os desejos de tais pessoas vigilantes e prudentes chegarão a um fim.
Um verdadeiro Brâmane anda intacto, embora tenha matado pai e mãe, e dois valentes reis, embora tenha destruído um reino com todos os vassalos;
Um verdadeiro Brâmane prossegue intacto, embora tenha matado pai e mãe e dois reis sagrados e um homem eminente ainda mais. Os discípulos do Gotama (Buda) estão sempre bem acordados e seus pensamentos noite e dia estão sempre fixos em Buda.
Os discípulos de Gotama estão sempre bem acordados e seus pensamentos dia e noite estão sempre fixos na lei.
Os discípulos de Gotama estão sempre bem despertos e seus pensamentos dia e noite estão sempre fixos na igreja.
Os discípulos de Gotama estão sempre bem despertos e seus pensamentos dia e noite estão sempre fixos nos seus corpos.
Os discípulos de Gotama estão sempre bem despertos e seus espíritos dia e noite sempre se comprazem na compaixão.
Os discípulos de Gotama estão sempre bem despertos e seus espíritos dia e noite se deleitam na meditação.
É difícil abandonar o mundo para tornar-se um frade, é difícil gozar o mundo; árduo é o mosteiro, dolorosas as casas; doloroso é morar com iguais, partilhar tudo em comum e o mendigo errante é assaltado pela dor. Por conseguinte não deixe nenhum homem ser um mendigo errante e ele não será assaltado pela dor.
Um homem cheio de fé, caso dotado de virtude e glória, é respeitado qualquer que seja o local que escolha.
As pessoas boas despedem cintilações de longe tal como as montanhas cobertas de neve; as pessoas más não são vistas, tais como setas desferidas à noite.
Sentado sozinho, deitado sozinho, andando sozinho sem cessar e sozinho se mortificando, deixe um homem ser feliz perto da orla da floresta.

22o Capítulo: Conduta Indigna

Aquele que dia o que não é verdade, vai para o inferno; também aquele que, tendo feito uma coisa, afirma não tê-la feito. Após a morte ambos são iguais: são homens de más ações no próximo mundo.
Muitos homens cujos ombros estão cobertos pelas roupagens amarelas (monges) são de índole má e sem moderação; tais homens por suas ações condenáveis vão para o inferno.
Melhor seria engolir uma bala de ferro incandescente, Como fogo vivo, do que um homem que não sabe moderar-se viver da caridade da terra.
Quatro coisas ganha um homem descuidado que cobiça a mulher do próximo - desmerecimento, uma cama sem conforto, em terceiro lugar, castigo, e finalmente o inferno.
Há desmerecimento e o caminho do mal para o inferno; há pouco prazer para o atemorizado nos braços do que não está com a consciência tranqüila, e o rei impõe um castigo pesado; por conseguinte, que nenhum homem pense na mulher do próximo.
Assim como a fôlha do capim em lâmina, se agarrada de mau jeito, fere o braço, o ascetismo mal praticado conduz ao inferno.
Um ato feito com descuido, um voto quebrado, uma obediência hesitante à disciplina (Brahma-karlyam), tudo isso não traz grande recompensa.
Se algo deve ser feito, deixe um homem fazê-lo, deixe-o fazê-lo com ardor! Um peregrino descuidado apenas espalha mais longe a poeira de suas paixões.
Uma ação má é melhor ficar por fazer, porque um homem dela se arrependerá depois; uma boa ação será melhor ser feita, pois desse modo, ninguém se arrepende.
Tal como uma fortaleza da fronteira bem guarnecida, com defesas internas e externas, assim deixe um homem guardar-se a si mesmo. Nem um momento escaparia, porque aqueles que deixarem o momento exato passar, sofrerão castigo quando estiverem no inferno.
Aqueles que se envergonham daquilo de que não devem envergonhar-se e não se envergonham daquilo de que devem envergonhar-se, tais homens, abraçando doutrinas falsas, entram no caminho do mal.
Aqueles que têm mêdo do que não devem recear, e não têm mêdo aquilo que devem recear, tais homens, abraçando falsas dou- trinas, entram no caminho do mal.
Aqueles que vêem pecados onde não há, e não vêem pecados. onde os há, abraçando falsas doutrinas, entram no caminho do mal.
Aqueles que vêem pecado onde há pecado; e nenhum pecado onde não os há, tais homens, abraçando a verdadeira doutrina entram no bom caminho.

23o Capítulo: O Elefante

Silenciosamente sofri os ataques, como o elefante nas batalhas suporta a seta desferida pelo arco: porque o mundo é perverso.
Eles levaram um elefante domado para batalhar, o rei monta um elefante domado; os domados são os melhores entre os homens, porque, silenciosamente, suportam os ataques.
As mulas são boas, quando domadas, o mesmo se dá com os nobres cavalos Sindhu e os elefantes de enormes prêsas; mas aquele que se domina a si mesmo é ainda melhor.
Pois com aqueles animais o homem não alcança as regiões não percorridas (Nirvana) onde um homem domado entra sôbre um animal domado - sôbre o seu bem domado eu.
O elefante chamado Dhanapalaka, seus templos ruindo com dolorosa sapa, e que é difícil de domar, não come nem um pouco quando prêso; o elefante anseia pelo bosque dos elefantes.
Se um homem se torna gordo e um grande comedor, se ele está adormecido e rola de um lado para outro, este louco, tal como um porco alimentado de grãos, tem que nascer uma e duas vêzes.
O meu espírito anteriormente errava por todo o lado a seu bel - prazer; como lhe aprazia, como lhe apetecia; mas agora eu o cingirei às rédeas completamente, assim como o domador que mantém o freio que subjuga o elefante furioso.
Não sejas inconsiderado, observa e guarda teus pensamentos! Sai do mau caminho, tal como o elefante quando se afunda na lama.
Se um homem encontra um companheiro prudente que com ele passeia, é sábio e vive sobriamente, pode passear com ele, superior a todos os perigos, feliz e considerado.
Se um homem não encontra um companheiro prudente para andar com ele, que seja sábio e viva sobriamente, deixá-la andar só, tal como um rei que deixou para trás o país conquistado - tal um elefante na floresta.
É melhor viver só: não há amizade com um néscio; que um homem ande só, que ele não cometa pecados, com poucas ambições, como um elefante na floresta.
Se surge a ocasião, os amigos são agradáveis; a diversão é agradável qualquer que seja ela; uma boa obra é agradável na hora da morte; o abandono de todo o pesar é agradável.
O mundo é agradável para quem é mãe, é agradável para quem é pai, é agradável para quem é Samana, e agradável para quem é Brâmane.
Agradável é a virtude que vai até a velhice, agradável é a fé que tem raízes profundas; agradável é o limite máximo da inteligência, agradável é o evitar dos pecados.

24o Capítulo: Sêde

A sêde de um homem descuidado cresce como uma trepadeira; ele corre de vida em vida, tal como um macaco à procura de fruto na floresta.
Quem quer que vença esta sêde ardente e venenosa neste mundo, terá seus sofrimentos duplicados tal como a abundante erva Birana.
Mas da parte daquele que vença esta sêde ardente, difícil de ser dominada neste mundo, os sofrimentos desaparecerão, tais como gotas d’água que caem de uma folha de lótus.
Dir-vos-ei uma palavra salutar - "Deveis, como muitos que aqui estão reunidos, extirpar as raízes da sêde, como aquele que deseja a raiz doce e perfumada da Usira deve extirpar a erva Birana, para que Mara, o tentador, não o possa esmagar uma e duas vêzes. como a corrente esmaga os caniços."
Como uma árvore, mesmo embora tenha sido cortada, mantêm-se firme e ereta enquanto as raízes estiverem boas e torna a crescer, assim, a menos que os fomentadores da sêde ,sejam destruí dos, êsse sofrimento da vida voltará uma e duas vêzes.
Aquele cujas trinta e seis correntes fluem com fôrça para os canais do prazer, as ondas - seus desejos que se fixam na paixão. - levarão embora êsse homem extraviado.
Os canais correm por tôda a parte, a trepadeira da paixão sobe brotando; se você vir a trepadeira subindo, corte suas raízes por meio do saber.
Os prazeres de uma criatura são extravagantes e luxuriosos; renunciando aos prazeres e procurando a felicidade, os homens sofrem uma e duas vêzes o nascimento e o declínio.
Rodeados de luxo, os homens andam de um lado para outro como lebres que caem em armadilhas; presos aos cadeados e correntes, sofrem a dor por muito tempo, uma e duas vêzes.
Rodeados de luxo, os homens correm de um lado para outro como uma lebre que cai numa armadilha; deixe, portanto, que o mendigo se livre da sêde, por meio do esforço em busca da sua Indiferença às paixões.
Aquele que, tendo se libertado da floresta do luxo (após ter alcançado o Nirvana), entrega-se à floresta da vida (ao luxo), e que, -quando livre da floresta (do luxo), corre para ela (o luxo), cuidado com este homem! embora livre, corre para a escravidão.
Os sábios não chamam de grilhões fortes os que são feitos de ferro, madeira ou cânhamo; apaixonadamente forte é a preocupação pelas pedras preciosas e pelos anéis, pelos filhos e pela esposa.
Os grilhões que os sábios chamam fortes, que arrastam para baixo, cedem, mas são difíceis de desfazer-se; após tê-los cortado finalmente, deixamos o mundo, livres de cuidados e deixando para trás os prazeres do amor.
Os que são escravos das paixões, correm para baixo em busca da torrente de desejos, tal como a aranha desce pela teia que ela mesma fêz; quando a tiverem cortado, finalmente, os sábios prosseguirão, livres de cuidados, deixando para trás tôdas as dores.
Abandona o que está adiante, abandona o que está atrás, abandona o que está no meio, quando fores para a outra margem da vida; se teu espírito está completamente livre, não entrarás novamente no nascimento e no declínio.
Se um homem se preocupa com dúvidas, cheio de paixões fortes e ansiando apenas pelo que é agradável, sua sêde aumentará cada vez mais e ele na verdade faz seus grilhões ficarem mais fortes.
Se um homem se apraz em acalmar dúvidas e, sempre refletindo, paira sôbre o que é agradável, ele certamente removerá, ainda mais, desfará os grilhões de Mara.
Aquele que tenha alcançado a consumação, que não treme, que estão tem sêde nem pecados, este destruiu todos os espinhos da vida: este terá sido seu último corpo.
Aquele que não tem sêde nem afeição, que compreende as palavras e lhes dá interpretação, que conhece a ordem das letras (as que estão antes e que estão depois), este recebeu seu último corpo,- este é chamado o grande sábio, o grande homem.
- "Venci tudo, sei tudo, em tôdas as condições da vida estou livre de nódoas; abandonei tudo, e por meio da extinção da sêde estou livre; tendo ensinado a mim mesmo, a quem indicarei como tendo sido meu guia ?"
O dom da lei excede todos os dons; a doçura da lei excede tôdas as doçuras; o prazer na lei excede todos os prazeres; a extinção da sêde supera todo o sofrimento.
As riquezas destroem os néscios se eles não procuram a outra praia; os néscios por causa da sua sêde pelos bens se destroem a si mesmos, como se estivessem destruindo os outros.
Os campos são danificados pelas ervas daninhas, a humanidade pelas paixões: portanto uma dádiva dispensada aos indiferentes traz grandes recompensas.
Os campos são danificados pelas ervas daninhas, a humanidade 'é danificada pelo ódio: portanto uma dádiva dispensada àqueles que não odeiam traz grandes recompensas.
Os campos são danificados pelas ervas daninhas, a humanidade é prejudicada pela vaidade: por conseguinte uma dádiva dispensada aos que estão livres de vaidade traz grandes recompensas.
Os campos são prejudicados pelas ervas daninhas, a humanidade pelo luxo; portanto um bem dispensado àqueles que estão livres da luxúria traz grandes recompensas.

25o Capítulo: O Bhikshu

Moderação nos olhos é bom, bom é a moderação nos ouvidos; no nariz a moderação é boa, boa é a moderação da língua.
No corpo a moderação é boa, boa é a moderação do falar, no pensamento a moderação é boa, boa é a moderação em tudo. Um Bhikshu, moderado em tudo, está livre de sofrimentos. .
Aquele que controla a mão, aquele que controla os pés, aquele que controla a fala, aquele que é bem controlado, aquele que acha prazer na vida interior, aquele que é recolhido, que é solitário e satisfeito, a este chamam Bhikshu.
O Bhikshu que controla a boca, que fala com prudência e calma, que ensina o que a lei significa, sua palavra é doce.
Aquele que vive na lei, que acha prazer na lei, que medita na lei, que se recolhe na lei: este Bhikshu jamais se afastará da verdadeira lei.
Deixe-o não desprezar o que recebeu, nem jamais invejar os outros: um mendigo que inveja outrem não alcança a paz de espírito.
Um Bhikshu que, embora receba pouco, não despreza o que recebeu, até os deuses o louvarão, se tiver a vida pura e não for indolente.
Aquele que jamais se identifica, com nome e forma, e não se aflige pelo que não mais existe, este na verdade é chamado um Bhikshu.
Um Bhikshu que se porta com bondade, que é feliz na doutrina de Buda, alcançará o lugar da calma (Nirvana), a felicidade surge da cessação das inclinações naturais.
Ó Bhikshu, esvazia este barco! quando vazio ele irá mais depressa; tendo extirpado a paixão e o ódio, irás para o Nirvana.
Despedaça os cinco grilhões, põe-nos de lado, eleva-te acima dos cinco. Um Bhikshu que fugiu dos cinco grilhões é chamado Oghatinna - "salvo da inundação".
Medita, Ó Bhikshu e não sejas imprudente! Não dirijas teu pensamento para o que dá prazer, a fim de que não possas por tua imprudência ter de engolir a bala de ferro do inferno e para que não possas gritar, quando estiveres queimando - "Eis a dor".
Sem saber não há meditação, sem meditação não há saber; aquele que tem saber e meditação está perto do Nirvana.
Um Bhikshu que entrou em sua casa vazia e cujo espírito se acha tranqüilo sente mais do que um deleite humano quando vê a lei claramente.
Assim que ele considerou a origem e destruição dos elementos do corpo encontra felicidade e alegria que pertencem àqueles que conhecem o imortal (Nirvana).
E este é o começo de um Bhikshu sábio: observação sôbre os sentidos, satisfação, moderação às leis; conservação de amigos nobres cuja vida seja pura e que não sejam indolentes.
Deixá-lo viver na caridade, deixá-lo ser perfeito em seus deveres; então na plenitude do deleite, porá fim aos sofrimentos.
Assim como a planta Vassika deixa cair suas flores fanadas, os homens devem abandonar as paixões e os ódios, Ó vós, Bhikshus!
O Bhikshu que tenha o corpo e a língua e o espírito aquietados, que é refletido e que rejeitou os atrativos do mundo, este é chamado calmo.
Eleva-te por ti mesmo, examina-te por ti mesmo, assim com tua auto-proteção e atenção viverás feliz, ó Bhikshu!
Porque o eu é o senhor do eu, o eu é o refúgio do eu; por conseguinte, domina-te como o mercador domina um cavalo nobre.
O Bhikshu cheio de deleite, que é feliz na doutrina de Buda, alcançará o lugar de repouso (Nirvana), a felicidade consistindo na cessação das inclinações naturais.
Aquele que, mesmo como um jovem Bhikshu, aplica a si mesmo a doutrina de Buda, ilumina este mundo tal como a luz quando livre de nuvens.

26o Capítulo: Brâmane

Corajosamente faze parar a corrente, põe de lado os desejos, Ó Brâmane! Quando tiveres compreendido a destruição de tudo o que foi feito, compreenderás aquilo que não foi feito.
Se o Brâmane alcançou a outra margem em ambas as leis, na moderação e na contemplação, todos os liames desaparecerão daquele que obteve o saber.
Aquele para quem não há nem margem de cá nem margem de lá, nem ambas, este, sem mêdo e sem grilhões, eu chamo de Brâmane na verdade.
Aquele que é meditativo, que não merece censuras, é ordenado, cumpridor dos deveres, sem paixões e que alcançou a mais alta meta, a este eu chamo na verdade de Brâmane.
O sol brilha durante o dia, a lua brilha à noite, o guerreiro mostra-se brilhante em sua armadura, o Brâmane é brilhante em sua meditação; mas Buda, o Desperto, é radiante de brilho dia e noite.
Porque um homem está livre do mal, é chamado Brâmane; por- que passeia calmamente, é chamado Samana; porque desembaraçou- se de todas as suas impurezas, é chamado Pravragita (1).
Ninguém deveria atacar um Brâmane, mas nenhum Btâmane, quando atacado permitir-se-ia fugir do agressor! Desgraça para aquele que fere um Brâmane, mais desgraça para aquele que foge diante do agressor!
Não é de pouca vantagem para um Brâmane se ele mantém o espírito longe dos prazeres da vida; quanto mais toda a vontade de injuriar tenha desaparecido, tanto mais cessará todo o sofrimento.
Chamo na verdade de Brâmane aquele que não ofende pelo corpo, por palavra ou pensamento, e mostra-se controlado nesses três pontos.
Aquele de quem se pode aprender a lei, como é ensinada pelo Bem-desperto (Buda), deixá-lo adorar com assiduidade, como o Brâmane adora o fogo do sacrifício.
Um homem não se torna um Brâmane por causa de seus cabelos trançados, por causa de sua família, ou pelo nascimento; naquele em que houver verdade e justiça, este é abençoado, este é um Brâmane.
O que adianta o cabelo trançado, ó néscio! o que adianta a roupa de pele de cabra? Dentro de ti há voracidade, mas exteriormente estás limpo .
O homem que veste roupas sujas, que é fraco e coberto de veias, que medita solitário na floresta, a este eu chamo, na verdade, um Brâmane.
Não chamo de Brâmane um homem por causa de sua origem ou a de sua mãe. Ele na verdade é arrogante e é rico; mas o pobre, que não tem nenhuma afeição terrestre, a este eu chamo na verdade um Brâmane.
Eu chamo na verdade um Brâmane àquele que, depois de ter despedaçado todos os grilhões, nunca treme, não tem liames nem grilhões.
Chamo na verdade de Brâmane àquele que, após ter cortado a correia e as tiras, a corda com tudo o que dela faz parte, destruiu todos os obstáculos e está desperto.
Chamo na verdade um Brâmane àquele que, embora não tenha cometido nenhuma ofensa, sofre a censura, os liames e os grilhões: aquele que tem paciência para sua firmeza e fôrça para seu exército.
Chamo na verdade um Brâmane àquele que está livre de cólera que é cumprido r dos deveres, virtuoso, sem ambições, que é controlado e que recebeu seu último corpo.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que não se apega a prazeres sensuais, como a água sôbre a folha do lótus, como a semente de mostarda na ponta de uma agulha.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que, mesmo aqui, sabe o fim de seu próprio sofrimento, depôs seu fardo e tirou os grilhões.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele cujo saber é profundo, que possui sabedoria, que distingue o caminho direito e o errado e que alcançou a mais alta meta.
Eu chamo, na verdade, Um Brâmane àquele que se conserva longe tanto dos leigos como dos mendigos, que não freqüenta casa nenhuma e que não tem senão poucos desejos.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que sem ferir criatura nenhuma, seja fraco ou forte, não mata nem motiva carnificina.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que é tolerante com o intolerante, suave para com o violento e livre de avareza entre os avarentos.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele de quem a cólera e o ódio, o orgulho e a hipocrisia caíram como a semente de mostarda cai da ponta da agulha.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que cita palavras verdadeiras, instrutivas e livres de aspereza, de modo a não ofender ninguém.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que nada leva no mundo que lhe não tenha sido dado, seja comprido ou curto, pequeno ou grande, bom ou mau.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que não nutre desejos para este mundo ou para o próximo, que não tem inclinações e que não tem grilhões.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que não tem interesses e que quando compreende a verdade, não pergunta - "Como? como ?" e que alcançou a profundeza do Imortal. Na verdade, chamo de Brâmane àquele que neste mundo elevou - se acima tanto dos liames, como do bem e do mal, que está livre de pesares, do pecado e da impureza.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que é brilhante como a lua, puro, sereno, imperturbável e em quem a alegria se extinguiu.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que atravessou esta estrada lamacenta, o mundo intransitável, difícil de atravessar, e sua vaidade, que desapareceu por completo, e alcançou a outra margem, é atento, firme, livre de dúvidas, livre de afeiçoes e satisfeito.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que neste mundo, tendo abandonado todos os desejos, erra sem um lar, e em que toda concupiscência está extinta.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que, depois de ter deixado tôda a escravidão aos homens, se elevou acima de tôda a escravidão aos deuses. e está livre de tôda e qualquer escravidão.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que deixou o que dá prazer e o que dá sofrimento, que é indiferente e livre de todos os germens de uma vida renovada: o herói que conquistou todos os mundos.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que percebe a destruição e a volta dos sêres por toda a parte, que é livre de escravidão vive na felicidade (Sugata) e desperto (Buda).
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele cujo caminho os deuses não conhecem, nem os espíritos (Gandharvas) nem os homens, cujas paixões estão extintas e que é um Arhat.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que não tem nada que chame de seu mesmo, seja adiante, por trás ou no meio; que é pobre e livre do amor do mundo.
Chamo, na verdade, um Brâmane, o másculo, o nobre, o herói, o grande sábio, o conquistador, o indiferente, o cheio de qualidades, o desperto.
Chamo, na verdade, um Brâmane àquele que conhece suas moradas primitivas, que vê o céu e o inferno, que chegou ao fim dos nascimentos, tem saber perfeito, é um sábio e cuja perfeição não tem mácula.