Kabir

A obra de Kabir (1440-1518) está em hindi vulgar e foi
transmitida verbalmente. Consiste em "palavras" na forma de
poemas curtos, em geral terminando em dísticos. Sua doutri-
na é basicamente hinduísta, mas esteve sujeita a influências
islamitas.
Kabir nega que as religiões, sejam o que forem, permitam
uma compreensão do mistério de Deus. Diz que uma experi-
ência mística é necessária para compreender e que o instrumen-
to para o misticismo é a ioga interiorizada do tipo ascético. No
número 3 reproduzimos uma passagem na tradução feita por
Tagore que, embora muito livre, não perde a ênfase.

1 . Sobre Deus

"Tu és Isso", é a pregação dós Upanichades; esta, a sua mensagem.
Grande sua confiança nisto; mas como podem, por mais pode-
rosos, descrevê-lo?

Pândita, teus pensamentos são todos inverídicos; não há aqui
qualquer universo ou criador;
Nem sutil, nem bruto, nem ar, nem fogo, nem sol, nem lua, nem
terra, nem água;
Nem a forma da luz, nem o tempo existem; não há palavra nem
corpo.
Não há ação ou virtude, nem mantras, nem adoração absoluta.
mente.
Os ritos e cerimônias não tem valor algum.
Ele é um e não há segundo. .

Onde quer que se olhe, lá, lá Ele é o mesmo; Ele se acha em
todos os recipientes.

Como posso explicar sua forma ou esboço? Não há um segundo
que o tenha visto
Como posso descrever a condição do incondicionado, que não
tem aLdeia ou lugar de descanso?
Aquele que deve ser visto sem qualidades; por qual nome o
chamarei?

Quando o fogo da avareza acaba, e a fumaça dos desejos não
mais se alça.
Então o homem saberá que um Deus está contido em toda
parte, e não há um segundo.

Aquele que reúne reside sempre separado de sua obra. (47)

2 . Ascetismo

Alguns cortam os cabelos dos homens e penduram o cordão em
seus pescoços
E se orgulham quanto à prática da ioga.
Que mérito existe nisso, em fazer seu assento voar?
Também o corvo e a pandorga circulam no ar.
sentados no ar, estudando a ioga, os Vedas, ritos e astrologia,
estão dementes.
Kabir dá que a esperança do iogue e jangama (a) murchou.
Diz o iogue: a ioga é o melhor de todos; ó irmão, Ele não tem
rival;
Iogues com cabelo trançado, ou barba raspada, lábios selados
ou tranças morenas - onde encontraram a sabedoria?

O iogue diz que só a ioga, e nada mais, é boa e doce;
Os que depilam o corpo, e os Ekshabdis,(b) dizem que só eles con-
seguiram a perfeição.
Sem Deus, tu estais perdido no erro, o cego!

Tu dependes de um bastão, brincos e capa remendada,
Em erro peregrinas na roupa de um iogue.
Põe de lado tuas atitudes devotas e tua suspensão do fôlego:
Abandona o engano, e adora sempre a Deus, o tolo! (47)

a) Um tipo de asceta.
b) Outro tipo de Moeda.

3. Anseio e Amor Por Deus

Diz Kabir: meu coração morre, embora viva ainda.
Diverti-me dia e noite com meus companheiros e agora tenho
muito medo.

Tão alto está o palácio de meu senhor, que meu coração estre-
mece em subir sua escada, mas não devo ser tímido, se quiser des-
frutar o seu amor.

Meu coração deve-se abrir para meu Amado; devo retirar meu
véu e encontra-lo com todo o meu corpo.
Meus olhos devem executar a cerimônia das lâmpadas do amor.
Diz Kabir: "Escuta-me, amigo; Ele compreende quem ama. Se
tu não sentes a ânsia do amor por teu Amado, é fútil adornar teu
corpo, fútil por ungüento em teus olhos".
As sombras da noite caem espessas e profundas e a treva do amor
envolve o corpo e a mente.
Abre a janela para o ocidente e perde-te no céu de amor.
sorve o mel doce que embebe as pétalas do lótus do coração.
Recebe as ondas em teu corpo - que esplendor, existe, na região
do mar!

Estou peregrinando ainda nas alamedas do conhecimento sem
objetivo, mas recebi suas notícias nessas alamedas do conhecimento.

Tenho uma carta de meu Amado e nela está uma mensagem im-
pronunciável, e agora meu medo à morte desapareceu.
Diz Kabir: "Ó meu amoroso! Tenho para meu presente o Imortal".
Este dia é mais querido que todos os outros, pois hoje o senhor
Amado é hospede em minha casa.
Minha câmara e meu jardim estão embelezados por sua presença;
Meus anseios cantam o seu Nome e se perderam em sua grande
beleza; eu lavo seus pés e olho seu Rosto e ponho à sua frente como
oferenda o meu corpo, minha mente e tudo quanto tenho.
Que dia de satisfação é este, em que o meu Amado, que é meu
tesouro, vem à minha casa Todos os males fogem do coração quando
vejo meu senhor.
Meu amor o tocou; meu coração anseia pelo Nome que é Verdade.
Assim canta Kabir, o servidor de todos os servidores. (48)